INFERNO - Rodrogo de Souza

A premissa mais curiosa na obra “Inferno”, que a Companhia Olga Roriz trouxe a Lisboa depois da sua estreia no Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, é a semelhança com a sua peça anterior, “Paraíso”, apresentada, o ano passado, no Teatro Nacional de S. Carlos.
Na verdade, ambas quase poderiam ter o mesmo título - “Purgatório”!

É que a coreógrafa, desta vez, navega numas águas muito calmas (para não dizer pouco profundas) para transportar os espectadores para o “reino de Hades”. E as repetidas cantorias que surgem ao longo de umas longas duas horas em nada ajudam a criar um clima de martírio ou de castigo divino. Mesmo no universo da metáfora, com ou sem fogo e gritos diabólicos, afinal de contas inferno é sempre inferno!
Começando pela cenografia, trata-se de um dispositivo base, amplo mas bastante simples: até ao meio da peça, tudo se passa dentro de três paredes de rede rematadas por arame farpado que, depois, são, manualmente, cobertas por cortinas amarelas. Se a ideia era de associar o espaço cénico inicial a uma prisão - ou, melhor ainda, a um campo de concentração - com tantas portas a abrir e fechar e gente a entrar e a sair repetidamente, perde-se, de imediato, a sensação de “huis clos” onde o desespero ou o caos nunca estão presentes.
Esta (pálida) visão infernal de Roriz parece ancorar-se na famosa frase de Jean-Paul Sartre: o inferno são os outros.
Com ironia, ou não, este “Inferno”, que se pode resumir a um somatório de sucessivas “pequenas histórias” (ou curtos incidentes), começa com Pedro Cal mostrando, um a um, os seus cd’s favoritos, seguido por um solo de Bruno Alexandre. Na pele de um qualquer pastor brasileiro de igreja “alternativa”, o bailarino promete o Paraíso depois de uma frenética descoberta de objectos vários que vai tirando de dentro de um enorme saco cheio de papelada.
As outras intérpretes, Maria Cerveira, Catarina Câmara e Sylvia Rijmer, tal como já tinham provado anteriormente, são de primeira água e não fariam má figura na companhia de Wuppertal, a da mãe da dança-teatro, Pina Bausch.

A peça é alimentada por muitos adereços (cadeiras, um remo, uma árvore de Natal, um colchão de praia, e outros) onde pontua um regador que chove sobre o corpo uma bailarina em fato de banho. Mais um “chiché” tão ao jeito germânico, tal como o ar demente que os homens se esforçam por exibir ao lado de sofisticadas mulheres (sempre de vestido comprido e saltos altos) mas, nem por isso, menos “afectadas” mentalmente!
A peça que termina com um plácido pic nic, peca pelas longas tiradas em inglês, umas com graças e outras nem tanto, e pela duração.
Depois de uns 75 minutos o “Inferno” de Roriz já arde com menos lenha caindo a obra num certo marasmo.