Data de publicação: 02/06/2010
No caso presente, as cortinas abrem-se sobre um palco nu com um homem de camisa branca e calças negras atrás de um monte de serradura iluminado verticalmente. Pouco a pouco nove homens trazem sacos que com mais serradura que vazam sobre o palco, que uma dezena de mulheres, posteriormente, se encarregam de espalhar pelo solo com movimentos soltos e agressivos que vão aumentando de intensidade.
Entre os machos, um ”solitário” (o Sábio, Jácome Filipe) dança como se se tratasse de uma sombra perdida entre as gentes. Com vestidos de várias cores e cabelos selvagens, uma das bailarinas, Marta Lobato de Faria (a Eleita) sobressai do conjunto enquanto que uma ténue cortina de chuva cai sobre os bailarinos. Mais uma suicida que dança até ao limite das suas forças, do que uma personagem do passado, escolhida pelo grupo para ser sacrificada, a mulher transforma a sua dança numa peça de resistência, lançando-se compulsivamente para o chão durante os últimos minutos de música, ao mesmo tempo que é observada pelos outros.
Muito bem recebidos pelo público, “Antes da Primavera” de Luís Tinoco (um curto apontamento musical interpretado pela Orchestrutopica, sob a direcção de Cesário Costa, que também liderou a Metropolitana de Lisboa a seguir) e “A Sagração” de Roriz, constituíram uma dupla de peso.
O bailado, contudo, tem os seus melhores momentos quando a “multidão” se levanta do chão e volta a cair em sequências canónicas, como ondas que se aproximam da praia e se desfazem na areia.
Não suficientemente divorciado da “fórmula Bausch”, a este trabalho falta-lhe, na recta final uma pequena faísca para ultrapassar com genialidade o tempo de um longo solo em que bailarinos e espectadores se tornam testemunhas impotentes da escolha de uma jovem que se auto-sacrifica até se imobilizar, como morta, no solo.
Para alguns criadores a "Sagração" tornou-se mais que um desejo, mais que um destino… uma verdadeira obsessão.
Para Olga Roriz, a “sua” Sagração, que deixa transparecer um pouco desse encanto e magia, encerra um mundo muito pessoal num trabalho maduro e visualmente estimulante.